O governo estuda parcelar a liberação do FGTS, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, bem como o da multa de 40% da demissão sem justa causa, para cobrir o pagamento do seguro-desemprego por um período de até três meses. A proposta foi confirmada ontem, 23, pelo ministro da Fazenda Henrique Meirelles após ter sido publicada pelo jornal O Globo. Com a mudança, o governo poderia reduzir gastos.
Apesar de Meirelles dizer que as discussões sobre o tema estão numa fase preliminar, a simples ideia de parcelar o pagamento do FGTS para substituir temporariamente o seguro desemprego gerou polêmica. Em nota, a CUT disse que a medida é uma “perversidade”: “Esse dinheiro não é do governo. É dos trabalhadores. Um país com mais de 14 milhões de desempregados tem de pensar em formas de geração de emprego e renda, de proteção ao trabalhador no momento em que este está mais desesperado e, não, confiscar o FGTS”, diz o texto.
Para alguns economistas especializados em finanças públicas, o sinal é ainda pior. Esse tipo de proposta – tirar dinheiro daqui, para cobrir um buraco ali – lembra os malabarismos fiscais do ex-secretário do Tesouro Arno Agostinho durante o governo de Dilma Rousseff, que, inclusive, serviram de munição para o impeachment. “Usar o FGTS para pagar seguro desemprego é contabilidade criativa na veia; é pedalada, só que agora com a bicicleta do trabalhador”, diz o pesquisador Jose Roberto Afonso, professor do Instituto de Direito Público (IDP).
Rombo
O seguro desemprego é mantido pelo FAT, o Fundo de Amparo ao Trabalhador, que está no vermelho. Como o governo é obrigado, por lei, a pagar o seguro, e o desemprego está em alta, no ano passado, gastou R$ 12 bilhões do Tesouro Nacional para cobrir o rombo do FAT. Neste ano, a estimativa é que o custo suba para R$ 17 bilhões.
Por causa disso, o seguro desemprego afeta diretamente o chamado resultado primário (que exclui o gasto financeiro da União). Hoje o primário também está no vermelho. A previsão para 2017 é de um déficit primário de R$ 139 bilhões.
“O pagamento do FGTS, por sua vez, não custa nada para o governo, pois de se trata de uma poupança do trabalhador cuja gestão é feita pela Caixa Econômica Federal”, lembra Vilma Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Em seu Facebook, o senador José Serra (PSDB/SP) chamou a ideia de “insensibilidade social infinita” e diz que a economia não justifica. “Quanto se economizaria? No máximo R$ 10 bilhões por ano. Sabem qual é o déficit agregado do setor público? Quase R$ 600 bilhões, incluindo juros”, posou o Senador.
O economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) lembra que o modelo de benefícios para trabalhadores demitidos é muito generoso no Brasil – tanto que durante o pleno emprego o pagamento do benefício bateu recorde. As pessoas chegavam a ficar num emprego temporário só para ganhar seguro desemprego. A medida em estudo pode ser um primeiro passo para corrigir distorções, mas fala clareza. “Do ponto de vista de modelo institucional, a medida é até correta, mas não pode ser feita assim; é preciso mais transparência para saber se o governo vai mesmo economizar ou ampliar outras despesas”, diz Appy. (Exame)